Millena Galdino
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completa 35 anos em julho de 2025. Ao longo desse período, consolidou-se como o principal marco legal de garantia dos direitos da infância e juventude no país. Criado em 1990, o ECA mudou a forma como o Brasil trata suas crianças e adolescentes. Passou a reconhecê-los como sujeitos de direitos e instituiu a doutrina da proteção integral.
Esse assunto importa porque garante a proteção integral das crianças e adolescentes, base para uma sociedade mais justa e igualitária, especialmente diante de novos desafios como a violência digital e desigualdades sociais.
Por que isso importa?
Desde então, trouxe avanços significativos. Houve melhorias nas áreas de educação, saúde, convivência familiar e combate ao trabalho infantil. No entanto, os desafios persistem.
O tema interessa a famílias, educadores, profissionais da saúde, órgãos públicos e toda a sociedade comprometida com os direitos humanos.
Para quem isso interessa?
Apesar das conquistas, a efetivação do Estatuto ainda encontra barreiras. A desigualdade no acesso a políticas públicas, a evasão escolar e a violência — inclusive o abuso e a exploração sexual — ainda atingem milhões de crianças e adolescentes. Soma-se a isso a precariedade de estruturas em conselhos tutelares e varas da infância, que muitas vezes não têm condições adequadas para aplicar a lei.
Novo cenário
Nos últimos anos, surgiram novas ameaças. O cyberbullying, a exposição precoce às redes sociais e a publicidade infantil abusiva são alguns exemplos. Com isso, a proteção da infância passou a enfrentar questões mais complexas. O Marco Legal da Primeira Infância (Lei 13.257/2016) e outras normas complementares tentaram atualizar o ECA. Contudo, ainda há um descompasso entre a legislação e a realidade digital vivida por crianças e adolescentes.
Diante desse cenário, especialistas reforçam: o ECA precisa continuar evoluindo. É necessário acompanhar as transformações sociais e tecnológicas, sem perder de vista sua essência.
Quais foram os maiores avanços até aqui? O que ainda precisa ser feito? E como preparar o Estatuto para os próximos anos?
Para responder a essas perguntas, o +QD conversou com Luciana Rodrigues Faria, advogada especializada em direito civil. Confira a entrevista:
+QD: Quais foram os principais avanços proporcionados pelo ECA desde 1990?
Luciana Rodrigues Faria: O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990), que completou 35 anos em 13 de julho, representou um marco na proteção dos direitos de crianças e adolescentes. Desde a sua criação, garantiu direitos fundamentais como o direito à vida e à saúde (art. 7º), à liberdade, ao respeito e à dignidade (arts. 15 e 17), à convivência familiar e comunitária (art. 19), à educação, cultura, esporte e lazer (arts. 53 a 58), além da profissionalização e proteção ao trabalho (art. 60).
Em 2016, com a promulgação do Marco Legal da Primeira Infância (Lei 13.257), o ECA foi ampliado para incluir políticas públicas específicas para crianças de até seis anos. Entre os avanços trazidos pela nova legislação, estão o aumento da licença-maternidade e o reconhecimento do direito ao brincar como essencial ao desenvolvimento infantil. A lei também ampliou direitos das gestantes, incluindo a proteção de mulheres que optam por entregar seus filhos à adoção e daquelas que cumprem penas privativas de liberdade.
Além disso, o Marco Legal estabeleceu que o Estado deve garantir políticas públicas voltadas à primeira infância com foco em áreas como saúde, alimentação, educação, convivência familiar, cultura, lazer, meio ambiente e proteção contra qualquer forma de violência ou pressão consumista. Isso inclui também a prevenção de acidentes e da exposição precoce à comunicação mercadológica.
+QD: Como o ECA tem lidado com questões atuais como a violência online e o uso precoce de redes sociais?
Luciana Rodrigues Faria: O Marco Legal da Primeira Infância também passou a prever medidas de proteção contra a violência digital e a comunicação mercadológica abusiva. A legislação brasileira já considera a publicidade infantil uma prática abusiva, reconhecendo os efeitos negativos da exposição precoce a anúncios e conteúdos comerciais.
Nesse sentido, normas como o Código de Defesa do Consumidor, o ECA, a Lei da Escuta (13.431/2017), o Marco Legal da Primeira Infância e a Resolução nº 163/2014 do CONANDA trabalham conjuntamente para coibir abusos e garantir a proteção integral das crianças no ambiente digital. Além disso, há proibição de trabalho infantil para menores de 14 anos, reafirmando a vulnerabilidade dessa faixa etária.
+QD: O que especialistas apontam como prioridades para o futuro do ECA?
Luciana Rodrigues Faria: Especialistas defendem a contínua adaptação do ECA às novas realidades sociais. A evolução da estrutura familiar e o avanço das tecnologias exigem uma abordagem mais ampla, que considere a diversidade das relações humanas e os novos riscos enfrentados por crianças e adolescentes. A erradicação do trabalho infantil, o combate à exploração sexual e a proteção contra crimes digitais, como o cyberbullying e a pornografia infantil, são prioridades.
+QD: Como garantir que o ECA continue sendo um instrumento eficaz diante das transformações sociais e tecnológicas?
Luciana Rodrigues Faria: A efetividade do ECA depende do engajamento de toda a sociedade — começando pela família e passando pela escola, conselhos tutelares, organizações sociais e poder público. É fundamental que todos os atores envolvidos na proteção da infância estejam comprometidos com a garantia de direitos, especialmente diante de um cenário de mudanças constantes.