PL propõe punir pais por abandono digital

Projeto quer responsabilizar pais que permitem que crianças e adolescentes sejam expostos a diversas violações online
PL lembra o dever de proteção dos pais - Freepik

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Danielle Biazi

Pais e educadores enfrentam dados alarmantes sobre a saúde mental de crianças e adolescentes. Esse tema tem sido debatido nos setores de saúde e educação e até em animações, como o filme Divertidamente 2, que aborda a ansiedade entre os jovens.

Especialistas estão desenvolvendo pesquisas para entender as origens desse preocupante quadro. No Brasil, um em cada seis jovens, entre 10 e 19 anos, vive com algum transtorno mental, segundo o relatório “Situação Mundial da Infância” da UNICEF. Além disso, a OMS indica que o suicídio é a terceira maior causa de mortalidade entre os jovens.

O autor e psicólogo Jonathan Haidt acredita que esse fenômeno está intimamente ligado ao uso da internet e à hiperconectividade entre jovens. Ele aborda essa questão no livro Geração Ansiosa. No Brasil, já existem movimentos liderados por pais e responsáveis que reivindicam a limitação do uso de telas e do acesso à internet por crianças e adolescentes, como o “Movimento Desconecta” e “Infância Livre de Telas”.


Por que isso importa?

Esse assunto é crucial porque afeta diretamente a saúde mental e o desenvolvimento de crianças e adolescentes, um público vulnerável e em fase de formação.

Nada disso é por acaso. Embora a rede ofereça um vasto universo de conhecimento, dados apontam diversos malefícios do uso da internet nessa fase de formação. Esses vão desde prejuízos no neurodesenvolvimento até disfunções de imagem. Além da exposição a crimes graves, como pornografia infantil, pedofilia, cyberbullying, instigação ao suicídio e aliciamento para grupos de ódio.

Papel dos pais

Qual é o papel dos pais? É fundamental e inafastável: cuidar, gerenciar e fiscalizar o que os filhos consomem nas redes sociais. Não dá para deixar solto. Se na vida real dizemos aos filhos “não falem com estranhos” e “não andem por ruas escuras”, no universo virtual isso é ainda mais necessário. Todos nós precisamos de letramento digital.

Nesse contexto, foi recentemente protocolado o Projeto de Lei nº 1.052/24, de autoria da deputada federal Rogéria Santos. O projeto torna crime o “abandono digital”, visando penalizar pais que negligenciam o uso da internet pelos filhos, permitindo que crianças e adolescentes sejam expostos a diversas violações, tanto físicas quanto psíquicas.


Para quem esse assunto interessa?

Tema é interessante para pais e educadores, porque eles são responsáveis por orientar e proteger os jovens em um ambiente cada vez mais digital e potencialmente perigoso. A questão também é relevante para profissionais de saúde, legisladores e a sociedade em geral, que precisam estar cientes dos riscos associados ao uso excessivo da internet.

Embora a criminalização do abandono digital seja novidade, o dever de proteção dos pais em relação aos filhos, dentro e fora da rede, não é. A Constituição da República, no artigo 227, afirma: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

Esse contexto se concretiza ainda mais com o poder familiar ou autoridade parental, bem descritos no Estatuto da Criança e Adolescente e no Código Civil Brasileiro. Além disso, cabe aos pais a responsabilidade por eventuais ilícitos civis praticados pelos filhos enquanto estão sob sua autoridade.

Controle parental

Vale lembrar que o espaço de proteção das crianças nas redes também possui disciplina no Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) ao estabelecer o chamado “controle parental” (artigo 29) na utilização de programas de computador pelos filhos, instituindo uma corresponsabilidade dos pais, dos provedores e do poder público na construção de boas práticas para a inclusão digital de crianças e adolescentes.

Do ponto de vista legal, os pais já têm o dever de acompanhar e monitorar a vida digital dos filhos. O projeto agora propõe a tipificação penal da negligência dos pais em relação a possíveis crimes cometidos ou sofridos pelos filhos devido ao uso indiscriminado da Internet, sem o devido acompanhamento e instrução. Esse é um recado importante.

Embora seja desafiador estabelecer limites à conectividade no mundo atual, é essencial que os pais promovam um diálogo constante, franco e aberto sobre esses temas. Isso é crucial para proteger o público infanto-juvenil, formado por cidadãos em formação, vulneráveis e merecedores de toda a proteção da família e do Estado.

Danielle Biazi

Danielle Biazi é advogada, doutora e mestra em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, professora em cursos de graduação e pós-graduação, e palestrante, também é advogada atuante no Direito Privado, associada ao Instituto Brasileiro de Direito de Familia (IBDFAM) e Instituto Brasileiro de Estudos em Responsabilidade Civil (IBERC).

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