Da Redação
A tecnologia transformou a parentalidade no século 21, desde dispositivos que entretêm crianças até aplicativos que monitoram seu desenvolvimento. As redes sociais adicionaram outra camada a esse cenário, introduzindo práticas como o “sharenting”.
O termo é uma junção das palavras inglesas share (compartilhar) e parenting (parentalidade) — refere-se à prática de pais publicarem fotos e informações de seus filhos nas redes sociais. Desde a primeira imagem de ultrassom até registros cotidianos, como aniversários ou apresentações escolares, muitos pais utilizam as plataformas digitais para dividir esses momentos com amigos e familiares.
Esse assunto importa porque a prática de “sharenting” pode expor crianças a riscos significativos, como roubo de identidade e assédio. Além disso, as imagens podem ter consequências imprevistas no futuro, afetando a privacidade e a segurança dos menores.
Por que isso importa?
Paulo Akiyama, advogado especialista em direito civil da Akiyama Advogados, faz um alerta. O sharenting é comum e compreensível, mas traz riscos. Os pais devem considerar as implicações legais, éticas e de segurança. “O que é compartilhado hoje pode ter consequências imprevisíveis no futuro”, afirma Akiyama.
Esse tema interessa a pais, educadores, advogados, e especialistas em segurança digital, que buscam equilibrar o desejo de compartilhar momentos com a proteção da privacidade das crianças.
Para quem esse assunto interessa?
Um relatório da Human Rights Watch (HRW) revelou que o modelo de linguagem LAION-5B, utilizado para treinar ferramentas de inteligência artificial, continha 170 imagens pessoais de crianças de pelo menos dez estados do Brasil. Alguém utilizou essas imagens sem o conhecimento ou consentimento das crianças e suas famílias. Pais, familiares ou os próprios menores publicaram a maioria delas originalmente em redes sociais. O relatório aponta que esse número pode ser significativamente inferior à quantidade real de imagens de crianças brasileiras presentes na plataforma.
“Um dos principais problemas é o roubo de identidade”, declara o advogado. Segundo ele, informações aparentemente simples, como o nome, a data de nascimento ou até mesmo a localização de uma criança, podem ser usadas por criminosos para fraudes e outros atos ilícitos.
Consequências
O conteúdo publicado na internet deixa rastros permanentes. Mesmo que os pais removam uma postagem, eles quase nunca conseguem garantir que terceiros não salvaram ou compartilharam a imagem. Outro fator alarmante é a exposição involuntária das crianças a assediadores. Além disso, fotos com uniformes escolares, locais frequentados ou geolocalização ativada facilitam o rastreamento por indivíduos mal-intencionados.
A ONG SaferNet, especializada em segurança digital, revelou um dado alarmante. Pessoas compram e vendem conteúdos de pornografia infantil com facilidade. Isso ocorre em grupos de bate-papo e canais na plataforma Telegram. A pesquisa identificou uma comunidade que chegava a 200 mil usuários e, somando todos os grupos analisados, o número de participantes alcançou 1,25 milhão.
De acordo com o especialista, as consequências do sharenting também podem ser percebidas no futuro da criança. Fotos consideradas embaraçosas ou comprometedoras podem causar constrangimento e impactar negativamente relações interpessoais ou oportunidades profissionais. Questões de privacidade são um ponto central nesse debate, já que muitas crianças são jovens demais para consentir com a publicação de suas fotos. Em países como França e Alemanha, as leis reconhecem o direito das crianças sobre suas imagens. No Brasil, a discussão ainda está em desenvolvimento. No entanto, a legislação já prevê o direito à privacidade e à imagem.
Publicar com segurança é possível
Apesar dos riscos, é possível compartilhar fotos de crianças de maneira mais segura, tomando algumas precauções. Verificar as configurações de privacidade das redes sociais é um passo importante para limitar o acesso às postagens apenas a amigos e familiares próximos. Desative a geolocalização. Evite compartilhar informações identificáveis, como nome completo, escola ou locais que a criança frequenta. Essas medidas são essenciais. Outra alternativa é utilizar apelidos ou emojis para substituir o nome real da criança, protegendo sua identidade.
“Com medidas simples, os pais podem proteger a privacidade e a segurança de seus filhos, garantindo que o compartilhamento de memórias seja seguro e consciente”, afirma Akiyama.