Renato Cirne
Escrevo este texto – na verdade, uma carta – como um torcedor que não possui qualquer vínculo político com a situação ou a oposição do Fluminense. Sou advogado, profissional de compliance com experiência em governança e licitações, além de sócio torcedor tricolor e apaixonado por tudo que envolve a história e o futuro do nosso clube. Não conheço dirigentes, conselheiros ou lideranças de grupo político. Escrevo como cidadão, profissional e torcedor que acredita que o Fluminense pode — e deve — ser uma referência em gestão no futebol brasileiro.
Tenho todos os elogios a fazer à atual diretoria por avanços importantes, como a reestruturação financeira, a manutenção de competitividade em campo e a condução de decisões difíceis com responsabilidade. Mas como torcedor engajado, também tenho perguntas e sugestões construtivas que acredito que precisam ser debatidas com transparência e respeito — especialmente no contexto da possível transformação do clube em SAF.
Uma SAF (Sociedade Anônima do Futebol) é um modelo jurídico criado pela Lei nº 14.193/2021 que permite que clubes de futebol no Brasil se transformem em empresas, com o objetivo de profissionalizar a gestão, atrair investimentos, aumentar a transparência e viabilizar a reestruturação de dívidas. Ao adotar esse formato, o clube transfere suas atividades relacionadas ao futebol para uma nova entidade empresarial, com estrutura societária própria, separando o patrimônio do clube associativo e permitindo a entrada de investidores que passam a ter participação na administração e nos lucros da operação.
O que é uma SAF?
Qual é o valuation do Fluminense?
O BTG foi contratado há anos para assessorar esse processo. Essa avaliação já foi concluída? Se sim, por que ainda não foi apresentada ao Conselho e aos sócios? Sem esse número, qualquer discussão sobre SAF fica fragilizada.
Por que o clube restringe a venda da SAF apenas a tricolores?
Entendo e respeito o valor simbólico dessa proposta. Mas limitar a concorrência restringe o potencial de arrecadação. Não seria fundamental apresentar também uma simulação de mercado aberto, para que os sócios possam comparar as opções com clareza?
Qual o impacto financeiro da limitação?
Quem aceita menor retorno financeiro por amor ao clube — o chamado “dividendo emocional” — naturalmente pagará menos pelo ativo. Isso precisa ser quantificado para que possamos decidir com responsabilidade.
Como o clube vai se proteger contra uma revenda especulativa?
Se um fundo de torcedores adquirir a SAF a preço reduzido e, mais tarde, revender a investidores não tricolores por valor de mercado, como o clube se blindará contra essa distorção?
Por que o clube não testa o valuation com terceiros não tricolores, ao menos para efeito de comparação?
A decisão de restringir ou abrir a concorrência não deveria ser compartilhada com o Conselho Deliberativo e os sócios? Parece arriscado que uma escolha estratégica de longo prazo seja feita exclusivamente pela diretoria.
E por fim, uma reflexão que considero essencial: o amor pelo clube também se constrói.
Fred e Assis não nasceram tricolores, mas tornaram-se ídolos eternos. Alguém realmente duvida de que John Textor hoje é, sim, Botafogo até a alma?
O sentimento nasce da vivência, do compromisso e da entrega. O Fluminense é grande o bastante para despertar isso em quem estiver disposto a construir junto.
Faço essa carta com respeito, sem paixões partidárias e com profundo desejo de ver o Fluminense forte, moderno e transparente.
Saudações tricolores