Barbara das Neves e Leticia Machado de Assis**
A abordagem ESG (Environmental, Social, and Governance) avalia a atuação das empresas em três áreas fundamentais: sustentabilidade ambiental, responsabilidade social e práticas de governança. Nos últimos anos, esse modelo de avaliação tornou-se indispensável à medida que governos, investidores e consumidores passaram a exigir práticas empresariais mais responsáveis.
O direito tributário não ficou alheio a essa transformação. Estados e autoridades fiscais em todo o mundo estão reconhecendo a importância das práticas ESG, ajustando suas políticas tributárias para incentivá-las. No Brasil, esse movimento também está ganhando força, com diversas iniciativas integrando a perspectiva ESG na política tributária.
Um exemplo significativo dessa tendência é a Portaria n.º 1241/23 da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), publicada em outubro de 2023. Essa norma introduziu considerações ESG nos acordos em transações tributárias. Além disso, permite a flexibilização de prazos e garantias para contribuintes envolvidos em projetos voltados ao desenvolvimento sustentável. Com isso, a portaria incentiva a adoção de práticas socialmente responsáveis.
Ademais, o instrumento da extrafiscalidade estimula ou inibe determinadas condutas no sistema tributário brasileiro. Assim, ele tem sido cada vez mais utilizado como uma ferramenta para incentivar a sustentabilidade e a inovação tecnológica. Além disso, busca desestimular externalidades negativas. Uma recente iniciativa do governo é o Programa Nacional de Mobilidade Verde e Inovação (Mover), instituído pela Lei n.º 14.902/2024.
Mover
O Mover substitui o antigo programa Rota 2030. Ele visa aumentar as exigências de sustentabilidade para a frota automotiva. Além disso, busca melhorar a eficiência energética do setor. O programa estimula o desenvolvimento da indústria local. Para isso, ele oferece incentivos vinculados à produção de novas tecnologias (P&D) nas áreas de mobilidade e logística. Em resumo, o programa concede benefícios fiscais à indústria automobilística em troca de compromissos específicos com práticas sustentáveis.
Uma das principais iniciativas do programa é a introdução do “IPI Verde”. Esse mecanismo foi criado para incentivar a produção de veículos que atendam a critérios de descarbonização.
Reforma tributária
A reforma tributária também reflete a preocupação com ESG. A tributação é a principal fonte de financiamento do Estado brasileiro. Portanto, é fundamental que a reforma esteja alinhada com os princípios da agenda ESG.
O artigo 145, §3º, da Constituição Federal destaca essa preocupação, ao estabelecer que o sistema tributário nacional deve observar os princípios da simplicidade, transparência, justiça tributária, cooperação e defesa do meio ambiente.
A inclusão do princípio de defesa do meio ambiente e do imposto seletivo na reforma tributária sublinha a necessidade urgente de combater as mudanças climáticas e conservar os recursos naturais.
Uma das medidas previstas na reforma é a introdução do Imposto Seletivo, que incidirá sobre bens prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. Além disso, a criação de um tributo visa coibir externalidades negativas. Esse tributo não se destina apenas à arrecadação. Na verdade, ele também busca desestimular atividades prejudiciais à sociedade. Ademais, pretende incentivar práticas essenciais ao desenvolvimento sustentável.
Benefícios fiscais
Benefícios fiscais que promovem práticas sustentáveis e favorecem empresas comprometidas com a sustentabilidade também podem alcançar esse incentivo. Um exemplo importante é a Lei nº 14.260/21, que estabelece incentivos direcionados à cadeia produtiva de reciclagem.
O Decreto nº 12.106/2024 regulamentou a medida e estabeleceu benefícios fiscais para pessoas físicas ou jurídicas que apoiarem projetos aprovados pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA).
As deduções do imposto de renda para valores direcionados aos projetos podem chegar a 6% para pessoas físicas e 1% para pessoas jurídicas. O Diário Oficial da União publicará as propostas aprovadas para captação de recursos e o site do MMA as disponibilizará.
Os projetos abrangem uma variedade de temas, entre eles, capacitação, formação e assessoria técnica, incubação de micro e pequenas empresas, pesquisas e estudos, implantação e adaptação de infraestrutura física, aquisição de equipamentos e veículos para coleta seletiva, organização e apoio a redes de comercialização e cadeias produtivas, fortalecimento da participação dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis, e desenvolvimento de novas tecnologias.
Agenda ESG
Essa abordagem integrada incentiva práticas sustentáveis, promove a inclusão social e gera renda em setores essenciais para a economia circular. Ao alinhar incentivos fiscais com sustentabilidade, o Brasil reafirma seu compromisso com a agenda ESG, criando um ambiente propício ao desenvolvimento de práticas empresariais responsáveis.
A adoção de práticas ESG pode gerar benefícios diretos e indiretos. Protegendo o meio ambiente e criando ambientes empresariais que respeitam o desenvolvimento sustentável, as sociedades não apenas contribuem para a sustentabilidade e a responsabilidade social, mas também podem se qualificar para vantagens tributárias. Esses incentivos fiscais, aliados a uma governança robusta, resultam em um ambiente de negócios mais saudável e competitivo, além de promover uma imagem corporativa positiva para investidores e consumidores.
*Barbara das Neves é advogada na Andersen Ballão Advocacia. Coach da UFPR no Tax Moot Competition Brasil. Professora de direito tributário em cursos de pós-graduação e MBA de instituições do Paraná. Membro da Comissão de Direito Tributário da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Paraná.
*Letícia Machado de Assis é advogada na Andersen Ballão Advocacia. É integrante do Grupo de Estudos Tributários da UFPR.