Da Redação
O aumento das demandas transferidas do legislativo para o judiciário tem gerado tensões entre os poderes. Isso resultou na judicialização de questões ligadas ao setor, com impacto direto no sistema agropecuário. Rudy Ferraz, diretor jurídico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), revelou durante o 4º Congresso Brasileiro de Direito do Agronegócio que atualmente existem 500 ações que podem afetar o setor, direta ou indiretamente.
“O poder executivo precisa cuidar do presente, enquanto o legislativo normatiza, pensando no futuro, e o judiciário visita o passado”, declara Ferraz, durante o painel direito de propriedade, função social e contratos agrários.
Moderado por Francisco de Godoy Bueno, conselheiro da Sociedade Rural Brasileira (SRB), o painel abordou ainda a recente decisão do Supremo Tribunal Federal a respeito da inconstitucionalidade do Marco Temporal e a promulgação pela Câmara do complemento da Lei.
Marco Temporal e Insegurança Jurídica
Nesse sentido, João Lima Junior, sócio do Lima Junior Domene e Advogados Associados, contextualizou o tema do Marco Temporal e afirmou que segurança jurídica e direito à propriedade estão relacionados. “Segurança jurídica pode ser traduzida como previsibilidade em todas as suas relações”, afirma João.
Outra questão importante é a proteção estatal para essa relação, pois é preciso ter a certeza de que o contrato será cumprido. Para ele, há uma crise constitucional em relação à propriedade no campo por conta das incertezas sobre o Marco Temporal.
A insegurança jurídica também prejudica os investimentos no setor, segundo Guilherme Rodrigues da Cunha, CEO da Ceres Investimentos. “Estamos vivenciando a primeira crise de preços no agro depois da pandemia, além da crise climática, o que trouxe um cenário desafiador. Essas questões somadas aos desafios em relação ao direito de propriedade, impossibilita acessar garantias e a recuperar o crédito”, declara.
Segundo ele, cerca de dois terços dos investimentos vêm da iniciativa privada. “Estamos voltando a um cenário anterior a 2018, quando era muito difícil fazer a composição das garantias dos papéis. Esse cenário coloca o setor em um momento de muita fragilidade”, diz Guilherme.
Thiago Castelliano, juiz de direito no Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, trouxe avaliações sobre as mudanças em relação às decisões judiciais de reintegração de posse, especialmente quando envolve grandes grupos e pessoas em situação de vulnerabilidade.
Houve a instituição de comissões para propor estratégias para o cumprimento judicial nesses casos, a fim de conceder prazo razoável para que aquela situação possessória seja desfeita. Ele comentou que existem 46 procedimentos abertos, sendo 24 na zona rural em seu estado.
Regulamentação do Fiagro
A consulta pública para a regulamentação dos Fundos de Investimentos nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro), realizada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), reuniu os comentários de mais de 20 participantes, entre entidades setoriais, escritórios de advocacia e gestores independentes.
A partir da análise desses comentários, será feita uma recomendação para aprovação do colegiado da CVM. Dessa forma, Bruno Gomes, Superintendente de Agronegócio e Securitização da CVM, afirmou, durante o 4ª Congresso Brasileiro de Direito do Agronegócio, que a regulamentação pode vir a ser publicada no segundo semestre deste ano.
Segundo Gomes, entre os pontos mais comentados foram a criação de um Fiagro mais abrangente, apelidado de Fiagro Multimercado, por não haver ainda um nome oficial, e a inserção do mercado voluntário de carbono para estimular a originação do crédito de carbono.
Para ele, o Fiagro tem uma dinâmica diferente de fundos imobiliários no que tange à distribuição de dividendos aos investidores, estando mais de acordo com o lucro contábil de uma companhia, e lembrou que a regulamentação do agro na CVM é relativamente nova.
O Fiagro, um fundo com flexibilidade regulamentar a ser divulgado pela CVM, pode resolver desafios como casos de Recuperação Judicial e recuperação de pastagens degradadas. Rafael Gaspar, sócio do Pinheiro Neto Advogados, enfatiza a importância da visão de longo prazo diante de crises ou recuperação judicial.
O painel sobre Agronegócio e Mercado de Capitais destacou a relevância do Fiagro, com participação da Consultora da CNA, Flavia Palacios, que ressaltou a necessidade de considerar o setor como um todo. Cesar Junior, da Serasa Experian, enfatizou a evolução da governança no agronegócio e a importância da qualificação dos CFOs para entender o mercado de capitais e a governança como fundamental para concessão de crédito.