Renato Cirne
A Reforma Tributária, aprovada em dezembro após décadas de debates e promessas de simplificação fiscal, representa a maior mudança no sistema de impostos do Brasil desde a Constituição de 1988. Mas a legislação incorpora um outro aspecto menos óbvio, que coloca o Brasil na vanguarda da tributação verde. Um novo passo na regulamentação da reforma, aprovado em janeiro, introduz incentivos para práticas sustentáveis e penalidades para atividades prejudiciais ao meio ambiente, consolidando os objetivos do Plano de Transformação Ecológica do Ministério da Fazenda, que busca promover sustentabilidade, inclusão social e geração de empregos qualificados.
Imposto seletivo
Uma das inovações mais relevantes da reforma é a criação do Imposto Seletivo (IS). O novo tributo será aplicado sobre produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, como cigarros, bebidas alcoólicas, bebidas açucaradas e veículos poluentes. O objetivo vai além da arrecadação: trata-se de uma medida estratégica para desestimular o consumo desses itens e incentivar modelos produtivos mais sustentáveis.
Além disso, o IS tem o potencial de impactar diretamente cadeias produtivas inteiras. Setores como a indústria automotiva, por exemplo, terão um incentivo extra para investir em veículos elétricos e combustíveis limpos, acelerando a transição para uma matriz energética mais sustentável. Da mesma forma, empresas que apostam em inovação ambiental poderão ganhar competitividade ao se beneficiarem de uma tributação mais favorável.
Economia verde
A reforma também inclui estímulos diretos para setores estratégicos voltados à sustentabilidade. Destacam-se os incentivos fiscais para biocombustíveis, capazes de contribuir para a redução nas emissões de carbono oferecendo benefícios tributários para a produção e o uso de combustíveis renováveis.
A nova lei também estimula a economia circular ao permitir que empresas que adquirirem materiais recicláveis de pessoas físicas ou cooperativas de catadores usufruam de créditos presumidos, incentivando a reciclagem e a reutilização de materiais.
Outra iniciativa relevante é a redução de 60% na alíquota padrão para produtos florestais, incluindo serviços ambientais, uma medida que fomenta a regeneração de florestas e outros biomas, fortalecendo práticas sustentáveis e preservacionistas.
Essas mudanças posicionam o Brasil como um player competitivo em mercados globais que priorizam cadeias produtivas ambientalmente responsáveis.
Inclusão
Outro ponto fundamental é a isenção de tributos para itens essenciais, como alimentos da cesta básica e medicamentos. Essa medida garante mais equidade na distribuição da carga tributária e contribui para uma sociedade menos desigual – afinal, não há desenvolvimento sustentável sem inclusão social.
Na mesma linha, a reforma introduz o mecanismo de cashback tributário, que devolve parte dos impostos recolhidos às famílias de baixa renda. Esse sistema corrige a regressividade histórica do modelo tributário brasileiro, que penaliza os mais pobres.
A reforma tributária brasileira vem no momento em que o país assume um papel cada vez mais ativo nos debates globais e posiciona o Brasil de maneira estratégica para a COP 30, que acontece em 2025 em Belém. As mudanças no sistema fiscal, como a taxação seletiva de produtos poluentes, a desoneração de cadeias produtivas sustentáveis e os estímulos à bioeconomia, reforçam o papel do país como referência na transição ecológica e reforçam seu protagonismo na agenda climática.
Novo modelo
A transição para o novo sistema tributário está prevista para começar em 2026 – incluindo um período de testes – e se estender até 2033. A meta é garantir que as mudanças sejam aplicadas de forma eficiente, visando sempre o tripé simplificação, justiça social e sustentabilidade.
No entanto, garantir que os incentivos ambientais tenham um impacto real exigirá um monitoramento rigoroso e políticas complementares para assegurar que os recursos arrecadados sejam, de fato, direcionados para ações sustentáveis.
As empresas ainda precisarão se adaptar às novas regras tributárias, o que pode representar um desafio inicial, mas também abre espaço para inovação e maior competitividade.
Futuro
Colocar o Brasil no bloco dos líderes em tributação sustentável depende das escolhas feitas agora. Empresas, sociedade civil e governo precisam trabalhar juntos para garantir o impacto no cenário global e o legado que pretendem deixar para as próximas gerações. Se bem implementada, a reforma tributária pode se tornar um instrumento poderoso para transformar o país em um modelo de economia verde e socialmente equilibrada.