Cristiano Zanetta
Segundo dados da pesquisa realizada pela International Stress Management Association (Isma), o Brasil ocupa hoje a segunda posição no ranking mundial de diagnósticos de Burnout — ficando atrás apenas do Japão. O dado, por si só, já seria suficiente para acender um sinal de alerta nas organizações. Mas a preocupação se intensifica quando olhamos para o que está por trás dessa exaustão: um cenário cada vez mais frágil, ansioso, não linear e incompreensível — o chamado Mundo BANI.
O texto mostra que preparar líderes para lidar com a complexidade atual, com empatia e adaptabilidade, é vital para garantir ambientes de trabalho sustentáveis, humanos e estratégicos. Ignorar essa realidade compromete a saúde das equipes, a retenção de talentos e os próprios resultados do negócio.
Por que isso importa?
O termo BANI surgiu como uma evolução do conceito VUCA (volátil, incerto, complexo e ambíguo), que durante anos ajudou organizações a descrever contextos voláteis e incertos. Mas o BANI vai além: ele aponta para um ambiente em colapso emocional, estrutural e relacional, em que não basta se adaptar às mudanças — é preciso aprender a navegar nelas com consciência, cuidado e humanidade.
Embora esse conceito se refira a um panorama global, é dentro das organizações que seus impactos se tornam mais visíveis e urgentes. Afinal, o trabalho ainda é o espaço onde grande parte das relações humanas, decisões críticas e pressões cotidianas se concentram — e é justamente aí que o BANI se materializa.
O tema interessa especialmente a líderes, gestores, profissionais de RH e alta direção de empresas, que têm o poder (e a responsabilidade) de transformar a cultura organizacional. Também é relevante para consultores, coaches, educadores corporativos e todos que atuam com desenvolvimento de liderança.
Para quem esse assunto interessa?
No ambiente corporativo, isso se traduz em pressões por entregas rápidas, metas cada vez mais voláteis e uma cobrança constante para se adaptar, sem espaço para processar. Líderes estão adoecendo. Equipes estão colapsando. E as estruturas que antes sustentavam o desempenho já não dão conta do novo tempo. É nesse contexto que a liderança adaptativa deixa de ser uma habilidade desejável e passa a ser uma competência vital.
O esgotamento silencioso nas empresas
Os modelos tradicionais de liderança foram moldados para cenários de previsibilidade. Eram eficazes quando o desafio era otimizar processos, escalar resultados e controlar riscos conhecidos. O problema é que, no mundo BANI, os riscos não são apenas desconhecidos — eles são, muitas vezes, incompreensíveis. A ansiedade se torna parte da rotina, e a instabilidade emocional, uma constante invisível.
Nesse novo paradigma, muitos líderes continuam operando com as mesmas ferramentas de antes, pressionando por performance sem perceber que estão desconsiderando a principal variável: as pessoas.
Burnout não é sinônimo de fraqueza — é um sinal de que o sistema entrou em colapso. E reconhecer esse sinal é uma responsabilidade direta da liderança. Embora nem todo estresse evolua para esse quadro, todo caso de burnout envolve um desgaste emocional contínuo e profundo.
Essa realidade é evidenciada pelo estudo Panorama do Bem-Estar Corporativo 2025, conduzido pela Wellhub (antiga Gympass), que aponta o estresse relacionado ao trabalho como o principal fator de deterioração da saúde mental para 47% dos colaboradores. Esse número supera outras fontes de preocupação, como a inflação (42%), o excesso de informações (14%) e a ansiedade provocada pelos avanços da Inteligência Artificial (9%).
A pesquisa, realizada com mais de cinco mil profissionais em nove países, reforça a urgência de estratégias robustas de bem-estar corporativo. Mais do que oferecer benefícios, as empresas precisam preparar suas lideranças para identificar sinais de exaustão e atuar com empatia e assertividade no apoio à saúde mental de suas equipes.
A liderança que escuta, acolhe e ajusta a rota
Desenvolvida por Ronald Heifetz e Marty Linsky, da Harvard Kennedy School, a liderança adaptativa parte do princípio de que nem todos os desafios podem ser resolvidos com respostas técnicas. Muitos deles exigem mudança de comportamento, ajustes de mentalidade e uma escuta ativa do contexto.
Mais do que conduzir estratégias, o líder adaptativo atua como um facilitador: ele cria espaços para que as pessoas possam refletir, processar e responder às mudanças de forma mais saudável e colaborativa. Isso requer vulnerabilidade, inteligência emocional e, principalmente, consciência.
Empresas que investem em formação adaptativa de seus líderes conseguem atravessar momentos de crise com mais coesão, reduzir índices de afastamento e construir ambientes de segurança psicológica. Não se trata de suavizar as metas, mas de fortalecer as pessoas.
Durante anos, atuei em hospitais ao lado de pessoas enfrentando seus maiores medos. Ali, não havia espaço para respostas prontas — só para presença, escuta e adaptação contínua. Curiosamente, é esse mesmo princípio que venho defendendo dentro das empresas: a capacidade de liderar com humanidade, sem abrir mão da estratégia.
O mundo BANI não é um cenário passageiro. Ele é o novo campo de jogo. E apenas líderes conscientes, capazes de ajustar rotas com flexibilidade, vão conseguir sustentar resultados sem sacrificar o essencial: a saúde mental e a integridade de suas equipes. Não basta ser competente. É preciso ser adaptável. E, acima de tudo, ser humano.