Por Cristiano Zanetta
A hiperconexão, marca distintiva da era digital, transforma nossas rotinas ao inundá-las com um fluxo constante de informações. Enquanto amplia as fronteiras da mente humana e potencializa conexões globais, também escancara desafios e contradições inerentes a esse novo ritmo de vida.
O termo ‘Brain Rot’, definido pelo dicionário Oxford como a expressão do ano de 2024, e traduzido literalmente como “podridão cerebral”, evidencia os impactos do consumo desenfreado de conteúdo superficial e da sobrecarga digital sobre nossa capacidade cognitiva. Mais do que uma metáfora, é um alerta para repensarmos como nos relacionamos com o fluxo incessante de informações que molda nosso dia a dia.
Segundo a publicação da Oxford University Press, o conceito não se limita ao consumo de conteúdo online. Mas no contexto atual, essa definição pode facilmente encapsular o uso irrestrito das redes sociais. De acordo com pesquisadores do Dicionário Oxford, o interesse pelo termo aumentou 230% entre 2023 e 2024. Esse crescimento parece estar relacionado à crescente preocupação com os efeitos causados pela exposição a conteúdos on-line de baixa qualidade.
Diante desse cenário e dos inúmeros casos relacionados ao uso excessivo das redes sociais — cada vez mais presentes em nossas rotinas —, os sintomas mais associados a esse hábito incluem dificuldades de foco e concentração, reflexo das constantes interrupções por notificações e atualizações instantâneas.
Uma pesquisa de 2022 realizada pelo King’s College London com 2.093 pessoas mostrou que 50% dos usuários de smartphones não conseguem evitar checar o aparelho mesmo quando deveriam estar concentrados em outras atividades, enquanto 49% acreditam que sua capacidade de atenção está menor do que costumava ser.
A criatividade também sofre, já que a dependência de conteúdos prontos reduz a capacidade de pensamento crítico e inovador. Além disso, a sobrecarga de informações prejudica a memória de curto prazo, enquanto a pressão de estar sempre conectado pode aumentar os níveis de depressão.
Um estudo conduzido pelo Instituto Cactus em parceria com a AtlasIntel, intitulado Panorama da Saúde Mental 2024, revelou dados preocupantes sobre o impacto do uso excessivo de redes sociais na saúde mental dos brasileiros. De acordo com a pesquisa, 45% dos casos de ansiedade entre jovens de 15 a 29 anos têm ligação direta com o consumo intensivo dessas plataformas. O estudo também constatou que indivíduos que passam mais de três horas diárias nas redes sociais têm 30% mais chances de desenvolver depressão em comparação aos que fazem uso moderado.
Diante desse cenário, superar os efeitos do “Brain Rot” pode parecer desafiador, mas não é impossível. A solução não está em abandonar a tecnologia, e sim em adotar uma relação mais consciente e estratégica com ela. Algumas práticas podem fazer uma diferença significativa:
- Pratique a “dieta digital”: estabeleça limites para o tempo de tela e defina intervalos para desconectar-se. Por exemplo, utilize aplicativos que bloqueiam redes sociais em determinados horários ou desative notificações não essenciais.
- Adote o foco intencional: evite multitarefas e concentre-se em uma atividade de cada vez. Técnicas como a ‘Pomodoro’ – método de gestão de tempo – ajudam a manter o foco e aumentam a produtividade.
- Priorize momentos para “recarregar a mente”: insira pausas regulares na sua rotina para atividades fora do mundo digital, como caminhadas, meditação ou hobbies que envolvam o uso das mãos.
- Fortaleça o aprendizado consciente: em vez de consumir conteúdo de forma passiva, busque aprender ativamente, fazendo anotações, discutindo ideias e aplicando o que absorve.
- Incentive conexões reais: invista tempo em interações presenciais e atividades que fortaleçam os laços interpessoais. A empatia é uma competência essencial para combater a alienação.
Superar o ‘brain rot’ exige uma combinação de autoconhecimento, disciplina e escolhas estratégicas. Reconhecer os impactos do excesso de telas e redefinir nossos hábitos não é apenas uma questão de equilíbrio, mas de reapropriação do nosso tempo e foco. Mais do que limitar o uso da tecnologia, é necessário redefinir nossa relação com ela. O real valor do digital está em potencializar aquilo que nos torna humanos: nossa capacidade de aprender, criar e evoluir.