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Por que precisamos de mais leis que promovam a igualdade entre homens e mulheres?

Penalidades sobre as mulheres podem se expressar na contratação, na remuneração ou em oportunidades de promoção
Estudos apontam a maternidade como fator determinante da desigualdade salarial entre homens e mulheres
Estudos apontam a maternidade como fator determinante da desigualdade salarial entre homens e mulheres - Freepik

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Thais Vasconcellos R. de Araujo

Em 3 de julho, foi sancionada a Lei nº 14.611/2023 que altera a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) e dispõe medidas relacionadas à igualdade salarial e critérios remuneratórios entre homens e mulheres.

Apesar do grande alarde trazido pelas matérias relacionadas à nova lei, fato é que a igualdade entre homens e mulheres e a vedação a qualquer tipo de discriminação de gênero já é prevista desde 1988, na Constituição Federal (sim, só em 1988).

Todavia, mesmo existindo dispositivos legais, sabemos que na prática a realidade é outra. O relatório do Fórum Mundial de Economia divulgou em junho de 2023 o alarmante e triste dado de que “a igualdade de gênero está estagnada: 131 anos para eliminar as desigualdades.”

Desigualdade

Muitos estudos apontam a maternidade como fator determinante desta desigualdade salarial entre homens e mulheres, tendo sido para tanto cunhado o termo motherhood penalty.

Essas penalidades podem se expressar no processo de contratação, nas remunerações, em oportunidade de promoções e até em serem as mães e mulheres preteridas na atribuição de tarefas. 

Embora os níveis pré-pandêmicos se mostrassem em crescente melhora, a pandemia escancarou que as mulheres continuam a suportar o peso da dupla jornada, da crise de custo de vida e das interrupções no mercado de trabalho. Também foram as mulheres que sofreram o maior número de demissões no período, chegando a representar 70% delas .

Mães solo

E mais: o Brasil possui mais de 11 milhões de mães solo (em sua maioria negras), sendo que mais da metade dos lares brasileiros hoje são providos por mulheres.

Os dados acima servem para ilustrar a necessidade não só de leis, mas de políticas públicas e privadas engajadas em modificar esta realidade e reduzir o gap de gênero agora – e não daqui há mais de 100 anos!

E quando eu digo pública e privada é porque se trata de um assunto que deve ser endereçado pela sociedade como um todo. Vou dar um exemplo: seria de extrema importância que pais e mães tivessem licenças parentais iguais – mas de nada adianta se não for obrigatória.

Ora, se os homens veem diariamente mulheres serem mandadas embora no retorno da licença-maternidade, como optar em tirar sua própria? E quem manda embora são as empresas privadas, logo, teríamos que falar de cultura organizacional também.

Transparência

Voltando ao conteúdo da lei, ela cria mecanismos de acompanhamento e vigilância, por meio da obrigatoriedade de publicação de relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios, permitindo a comparação objetiva entre salários, remunerações, proporção dos cargos de direção, gerência e chefia ocupados por mulheres e homens, bem como dados relacionadas à raça, etnia, nacionalidade e idade.

As empresas deverão ainda apresentar e implementar planos de ação visando mitigar as desigualdades encontradas, prevendo metas e prazos, bem como seja garantia a participação de representantes das entidades sindicais e de representantes dos empregados nos locais de trabalho.

O art. 4º da Lei nº 14.611/2023 apresenta medidas para garantir a igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens. São elas:

1. estabelecimento de mecanismos de transparência salarial e de critérios remuneratórios

2. incremento da fiscalização contra a discriminação salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens

3. disponibilização de canais específicos para denúncias de discriminação salarial

4. promoção e implementação de programas de diversidade e inclusão no ambiente de trabalho que abranjam a capacitação de gestores, de lideranças e de empregados a respeito do tema da equidade entre homens e mulheres no mercado de trabalho, com aferição de resultados

5. fomento à capacitação e à formação de mulheres para o ingresso, a permanência e a ascensão no mercado de trabalho em igualdade de condições com os homens.

Penalidades

A falta de publicação do relatório semestral importará na aplicação de multa administrativa, isto é, aplicada pelo Poder Executivo, correspondente até 3% da folha de salários dos empregados, limitada a 100 salários-mínimos, o que corresponde a R$ 132.000,00, em 2023. Importante destacar que a multa não é revertida às funcionárias que possuírem a remuneração inferior, as quais precisariam pleitear indenização própria junto ao Judiciário.

A lei não trata especificamente da situação das mães, mas de discriminações em geral. Contudo, certamente terá impacto positivo também sobre as mães que se beneficiarão das políticas afirmativas de contratação, capacitação e ascensão profissional promovidas por ela.

Espera-se que com a criação de diretrizes de conscientização, metas e mecanismos de fiscalização – e penalidades, claro – consigamos iniciar uma crescente melhora no ambiente de trabalho e, especialmente, nos planos de carreira das mulheres tão impactados após a maternidade.
Ah! Por fim, mas não menos importante, mantenhamo-nos vigilantes, pois como disse Simone de Beauvoir: “Nunca se esqueça que basta uma crise política, econômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados. Esses direitos não são permanentes. Você terá que manter-se vigilante durante toda a sua vida”.

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Thais Vasconcellos R. de Araujo

Thais Vasconcellos R. de Araujo é advogada, investidora-anjo e CLO da B2Mamy, comunidade que cuida de quem cuida e que conecta mães e mulheres ao ecossistema, capacitando-as como líderes e promovendo sua independência econômica. Também é fundadora e sócia do MVT Advogados. Curiosa e viajante, como se define, é mãe do Dudu e madrasta da Mamá e da Lelê.

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